quinta-feira, 22 de março de 2018

Sobre hoje...



Boa noite amiguinhos.
Como vocês estão?
Uma dezena de post atrás, eu falei que eu seria completamente aberto sobre a minha história, sobre a minha transição e tal, mas também falei no fim do blog.
Mas para os leitores de plantão, podem ficar tranquilos, acho que pelo menos até julho a gente segue por aqui.

E como eu gosto de cumprir aquilo que eu prometo, vim falar para vocês sobre o dia de hoje.
Meu dia começou as 06hrs, quando levantei me achando estranho, fui ao banheiro e o que eu menos esperava, estava acontecendo, eu estava, depois de muito, mas MUITO tempo mesmo, menstruado.
Fiquei arrasado, muito chateado mesmo.
Eu estava todo sujo de sangue, tive que jogar minha cueca fora.
Peguei a toalha e fui tomar banho.
Fiquei ali parado em baixo do chuveiro por um tempinho e quando percebi eu estava chorando.
Chorei muito, porque não se pode lutar contra a natureza do corpo humano.
Fiquei pensando em como fui apunhalado pelas costas, pego de surpresa.
Enquanto chorava, pensava: Eu não posso ser o homem que eu sou. Porque continuar forçando uma coisa que foge completamente do meu controle? Pq insistir quando se sabe o fim?
Fiquei um tempão ali e aquela "voz" na minha cabeça, que eu gosto de pensar que é a voz da Pri, a personagem que viveu minha vida por 30 anos, me falava para ter calma, ter paciência, não deixar isso me derrubar, ficava repetindo várias vezes que no momento que eu desistir eles vencem e é meio irônico pq é exatamente isso que eu digo quando algum amigo ou amiga esta mal.
"Não acabou ainda."
"Te proíbo de desistir"
"No momento que você desistir, eles vencem!Eles não podem vencer."
"Vamos, não é o fim, não é o fim, você consegue, conseguiu até aqui e continuará conseguindo."
"Você não chegou até aqui para desistir agora."
"Ainda não acabou, ainda tem muito mais pela frente, tem muito mais!"
A voz dizia enquanto eu chorava.
Eu realmente fiquei muito mal mesmo.
Terminei de me lavar, sequei o banheiro e fui colocar roupa.
Para cada peça que eu vestia ia ficando mais difícil, cheguei a pensar, inclusive, em faltar no trabalho.
Mas é aquilo que eu sempre disse a vocês, eu não tenho o luxo de faltar e ser descontado.
Eu tenho contas para pagar, eu tenho responsabilidade não só comigo, mas com a minha família.
Se eu assumo uma responsabilidade, sou o tipo de pessoa que faço questão de cumprir.
Lembrando disso, consegui terminar de colocar a roupa, com os olhos cheios de lágrimas, mas consegui. 

Depois disso fui tomar café.
Minha nossa senhora, eu estava para desabar ali mesmo.
Até dei uma patada na minha mãe logo cedo, justamente para evitar conversa independente do assunto, eu não conseguiria e teria que explicar para ela pq eu estava me sentindo tão mal e ela não entenderia, para ela é tipo "É apenas uma menstruação."
Acho que poucas pessoas, da até para contar nos dedos de uma mão só que entendem de verdade o impacto da menstruação na vida de um transexual.
Comi rapidinho, eu precisava sair logo de casa, eu ia trabalhar de carro, então eu podia desabafar lá.
Não teria ninguém para me perguntar o que estava pegando, eu não teria que explicar nada.
Enquanto dirigia, liguei o rádio, qualquer coisa era melhor que aquele silêncio.
Quando cheguei no serviço, estacionei na rua de baixo e foi bom porque fiquei ali sentado por alguns minutos, eu podia simplesmente ir para qualquer lugar da cidade, ficar sozinho, no meu cantinho, mas lá estava o pensamento da responsabilidade de novo.
É preciso continuar.
Não importa o que aconteceu na sua vida, não importa se você esta bem ou não esta.
Não importa quais são as condições daquele dia, não importa nada.
O jogo continua e você é obrigado a continuar jogando.
Dou graças a Deus que minha mãe e minha avó me ensinaram a ser trabalhador, a lutar por aquilo que queremos ter, pq as lições lá trás me fizeram a pessoa que eu sou hoje.

E para piorar ainda mais a situação, eu tenho um fluxo grande, ou seja, tenho que trocar de absorvente a cada duas horas, no máximo, além da cólica (Parabéns a todas as mulheres, realmente são muito guerreiras) e da pertubação psicológica...Ah! E do medo de sujar a calça também.
Foi um dia muito difícil para mim, eu não contei para quase ninguém, apenas para a minha chefe para ela não achar que eu estava com algum problema com ela, para a Carol, porque tive que pedir descarte de absorvente que só tem nos banheiros das meninas e eu não entro mais lá e para minha grande amiga Bruna que me deu apoio.
Juntando tudo isso, tornou o meu dia difícil.
Eu não queria nem levantar da cadeira, não queria sair do meu lugar por motivo nenhum, mas o dever me chamava e eu fui. Tive várias crises de choro durante o dia, mas fui e fiquei até o último minuto do jogo. Eu sei que tem muitas pessoas que também engolem as merdas da vida porque sabem que não podem parar agora, mas acho que se todo mundo pensasse assim, talvez, o aprendizado de cada um seria muito melhor.
E me deixou pior ainda saber que a equipe da limpeza sabia que eu estava menstruado, porque eles viam no lixo o absorvente embrulhadinho no descarte próprio.
Tive a sensação de que os papéis teriam mudado, seria eu o personagem e a Pri a verdadeira pessoa?
Estaria a minha mascara caindo?
Eu cheguei a falar para a Bruna que eu estava desistindo e ela me perguntou: Me diz como que você vai desistir de ser você mesmo, na hora não respondi, não sabia o que responder, mas no momento em que a Pri volta, é a minha desistência, por que em uma vida, só cabe uma pessoa para viver e contar a história, verdade seja dita.

Pior que teve festinha de aniversário dos meus colegas e eu nem consegui interagir, apenas estava ali sentado, olhando para os meus colegas falando sobre seus assuntos profissionais, brincando e fazendo piadinhas para descontrair. Prestei atenção em quase todo mundo falando, dei uma escapadinha até Júpiter, mas logo voltei, eu precisava voltar.
Pela primeira vez na reunião anunciei que eu não tinha nada para falar.
Eu não estava com ânimo, eu não estava afim, a minha sorte é que havia chegado uns caras que vieram buscar uns documentos comigo então fui dispensado da reunião na reta final.
Quase que não conversei na sala.
Não cantei.
Nem reclamei do exagero das meninas de manter a sala em 23ºC.
Fiquei na minha, trabalhando do jeito que dava.
É preciso continuar, de um jeito ou de outro, é preciso continuar.
Luxo apenas ricos tem, porque se não da certo os pais pagam as coisas deles e assim é a vida, os pobres sempre tiveram que ralar 3x mais para conseguir algo na vida.
Mas vamos seguindo...
Sempre em frente.

Se Deus quiser, amanhã meu fluxo estará menor e quem sabe estarei livre disso no final de semana.
Mas que isso foi difícil foi mesmo.
E a verdade é que no fim eu não sou homem, talvez eu seja a metade de um ou uma pequena parcela, mas hoje fui apunhalado, meu próprio corpo me traindo.
E eu nem posso tomar anticoncepcional porque eu fumo e a mistura dos dois leva a trombose ou seja, estou todo fodido por todos os lados e de todos os jeitos, não tem jeito.

E eu só aqui sentado, olhando a vida passar, porque pelas nossas escolhas nós não tivermos a oportunidade de seguir em frente do jeito que queríamos, ou seja, o jeito é aproveitar a vida do jeito que da, infelizmente.

Enfim, é isso ai..
Valeu pela atenção galera!!

Um abraço!

Pedro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário