quarta-feira, 10 de junho de 2020

POR DO SOL



Eu não sei explicar direito, mas quando estou triste adoro ver o por do sol mesmo que em fotos como essa acima.
A tela da minha área de trabalho é um por do sol.
Quem mora na cidade, em área comercial, para ser mais exato, não tem muitas opções para apreciar um belo por do sol, ainda bem que essas fotos existem, melhor do que nada.

Bom, muito provavelmente ninguém entenderá o que vou falar, mas vou falar mesmo assim.
Ontem passei o dia me sentindo um caco, não sei bem pq, acho que o tempo nublado da preguiça.
Hoje de manhã acordei bem melhor, pensei em como o dia vai ser melhor que ontem, aproveitar mais.

Eu estava errado.
Conseguiram me magoar logo cedo.
Sim, eu sei que sou muito sensível, que parece que me coração fica do lado de fora do peito, mas eu não consigo mudar isso, por mais que eu tenha tentado.

Eu estava no quintal fumando e meus pais na cozinha.
Escutei ele falando para a minha mãe que eu deveria deixar o cabelo crescer mais um pouco e pentear de lado, minha mãe perguntou se era igual como ele fazia quando era pequeno, ele respondeu dizendo que são casos diferentes por que ELE É HOMEM!
Ele!! Não eu, ele!!!

Para quem não é trans talvez não entenda como é triste esses momentos.
Para quem não acorda todos os dias lembrando que o sexo da sua alma e do seu corpo não são os mesmos, não entenda como é triste esse momento.
Para quem não fica em casa o dia todo devido ao isolamento social, pandemia e tal, ouvindo o dia inteirinho as pessoas te tratando como mulher, não entende.

Não é ruim ser mulher.
Muito pelo contrário.
Sempre achei a mulher um ser mais evoluído do que o homem.
E todas as coisas boas que eu sei hoje, aprendi sendo mulher até me encontrar verdadeiramente.
Não é ruim ser mulher.
Inclusive, se eu fosse, minha vida seria mais fácil, esse momento não iria me doer, me magoar.
Eu não teria uma sociedade inteira para enfrentar.
Não teria q passar por todo um processo que tem q ser feitos em partes porque as pessoas que mandam no mundo não entendem.
A maioria nunca tentou entender a minoria.

Eu sempre disse que as pessoas tem tempo para se adaptar a minha real identidade.
Nunca sequer forcei ngm, cobrei ngm, isso dói, mas sempre estive certo de que esse é o caminho.
O problema de dar tempo as pessoas, é que as vezes, parece que elas não estão tentando se adaptar.
Talvez aquele velho jeito de deixar para depois.
Não me importo de dar mais tempo, mesmo que isso me fere diretamente.
Mas as vezes as pessoas exageram.

E no fim, é como minha chefe sempre diz:
"Ninguém é obrigado a aceitar, mas respeitar, é sim."
Meus pais não precisam me chamar de Pedro ou me tratar no masculino, sei que é difícil para eles mudar as coisas assim depois de 30 anos.
Mas meu pai exagera demais.
Me chama pelo nome antigo a cada 5 minutos.
É irritante.
Ignora-lo não resolveu.
Nós nunca tivemos uma relação boa, mas nem por isso precisa me atormentar tanto assim.
Falando em atormentar, já não basta minha alma atormentada dia e noite?
A guerra inteira dentro de mim e a gritaria dentro da minha cabeça?
Deveria bastar.
Mas não dói nele né, então é fácil.

Contei para uma amiga e ela me perguntou pq eu não falo nada pra ele.
Pq qualquer coisa q eu tente falar, ele não entenderia e ficaria todo irritadinho, o clima iria pesar e não estou na vibe de começar outra luta em busca de respeito a minha identidade, ainda mais agora que estamos todos em casa em isolamento social.

Ainda bem que existe whatssap, assim consigo falar com meus amigos.
Eles me tratam como eu realmente sou. É isso que salva os meus dias.
Tenho sentido muita saudades do meu trabalho, além de me sentir útil, lá todos me tratam como eu realmente sou, me chamam de Pedro, me tratam no masculino.
Lá eu sou livre, eu sou feliz, eu sou completo.
Diferente da minha própria casa.

E sabe o que é mais irônico?
Quando minha avó morreu, achei que tinha acabado essa putaria de duas identidades.
Muito enganado eu estava.
Não acabou.
E sinceramente? Acho que nunca acabará.
Faz 4 anos que eu me assumi publicamente e nada mudou.
Quando minha mãe não esta por perto, alguns primos me chamam no masculino, o que é legal.
Acho que esperam ela sair de perto por respeito a ela.
Não acho ruim, não vejo problemas nisso.
Pq no fim, família é muito complicado.
E eu entendo, de verdade.
Mas meu pai exagera.
É irritante.

Para eu não ficar enchendo o saco das pessoas no whatssap reclamando disso enquanto tem milhares de pessoas morrendo mundo a fora com uma doença q não tem cura, resolvi escrever aqui no blog, afinal, é essa a funcionalidade dele né, desabafar aqui para não alugar o ouvido dos outros.

Enfim, é isso.
Encerro com um pedido.
Se você tem um trans na família, respeite-o.
Você não precisa aceitar, mas o respeito jovem, vem do berço.

E aos que me tratam no masculino só quando minha mãe não esta por perto, podem continuar, não tem problema, ela é a única q faço questão de não magoar nunca no mundo.

Um abraço,

Pedro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário