sexta-feira, 28 de julho de 2017

A palestra foi hoje!


Boa tarde.

No fim das contas a entrevista foi hoje.
Eu tentei ficar apresentável, usei uma camisa preta com gravata.
Foi um nervoso que não da pra colocar em palavras.
A imagem acima mostra exatamente como estávamos, a chefe dando a palestra dela de uma forma brilhante e eu no cantinho esperando chegar a minha vez quando tendo um treco de tanto nervoso, visto que, hoje meu público, pela primeira vez foi maior.
Quando ela me chamou, minha vontade foi de sair correndo para o lado oposto, acho que ela mesma percebeu que eu hesitei em ir , mas acabei respirando bem fundo e fui.
Não levei no papel tudo o que eu deveria falar, nos últimos minutos, antes de ser a minha vez, havia decidido que diria aquilo que me viesse a cabeça e foi quase tudo como estava descrito no post anterior.

Falei sobre minha deficiência auditiva.
Falei sobre eu secretamente ser formado pela Universidade Paulista em Enfermagem.
Contei porque eu não segui carreira.
Contei os dois anos que fiquei parado sem trabalhar e estudar.
Contei o motivo.
Contei que mentia no currículo e só deu certo quando parei de mentir e que eu acredito de verdade, que todas as outras entrevistas que fiz não deram certo porque eu tinha que terminar aqui onde estou hoje, nesta empresa, que graças a Deus, abraça a diversidade.
Contei que estou há 6 anos na Empresa, que comecei em uma salinha bem pequena, sem janela, apenas arquivando os documentos que a chefe pedia e que eu realmente acreditava que aquilo era tudo o que eu ia conseguir para mim e estava tudo bem.
E que ao longo desses 6 anos, eu tive milhões de aprendizados, milhões de oportunidade, vi o mundo corporativo com outros olhos.

Muitas coisas, mas muitas coisas mesmo e muitas pessoas ao longo desta jornada tentaram encontrar uma forma de me fazer parar e houve momentos em que quase conseguiram, mas eu continuei insistindo e hoje estou aqui.
Faço parte do grupo de diversidade da empresa, sou o único a representar a transexualidade neste grupo e o primeiro funcionário transexual da nossa sede no Brasil.



Peguei essa foto no Google porque achei que ela é a que mais representa o momento.
O meu publico era um publico de adolescentes/jovens e eu me senti um jovenzinho ali na frente deles, tremendo que nem vara verde, morrendo de tanta vergonha, que se eu pudesse eu teria aberto um buraco no chão e enfiado a cabeça lá.
Sim, eu sei que eu já deveria ter me acostumado com isso visto que sou eu quem apresento o nosso departamento toda vez que tem boas-vindas para os funcionários novos, mas não, eu não me acostumei não senhores.

Não vou conseguir lembrar de tudo para contar para vocês, pq o nervoso foi tanto...
Mas eu lembro de quando eu estava falando sobre a transexualidade, eu disse que aqui na empresa, graças a Deus, eu posso ser quem eu sou, todos respeitam a minha nova identidade, uso o banheiro masculino e sou muito bem tratado como o homem que eu sou.
Mas, por outro lado, lá em casa eu ainda tenho que viver como Priscila, eu ainda tenho que manter duas identidades e por causa disso eu tenho que prestar muita atenção quando estou falando com determinada pessoa, porque eu simplesmente não falo no masculino com a minha família e isso é algo realmente muito difícil que eu tenho que fazer no meu dia a dia e tem horas que eu acho que não vou mais aguentar, que vou explodir e a merda estará feita.

Ai um dos jovens falou: "Se uma vida, uma identidade já é difícil, imagina duas."

E realmente é muito difícil mesmo, mas eu continuo fazendo isso pela minha mãe, pq a minha avó, o tamanho da ignorância dela, ela simplesmente não sabe resolver as coisa somente comigo, ela desconta na minha mãe, ela envolve quem não tem nada a ver, ela maltrata quem não esta na história e eu continuo com o mesmo pensamento, não posso fazer isso com as pessoas que amo, então, por enquanto, vai ser assim, enquanto eu morar na cada dela, terá de ser assim.
Tem sido muito complicado, hoje, por exemplo, eu tive uma crise de choro no banheiro do trabalho, do nada, eu estava sentado na minha estação de trabalho, alimentando a planilha de mapeamento de tv a cabo pelo prédio, quando do me veio uma vontade enorme de chorar e corri pro banheiro e ai veio aquela voz na minha mente:
"Pedro, se você desistir, todos os outros ganham..."
Outros = transfobicos, religiosos fanáticos...

Eu quero continuar lutando sim.
Eu vou lutar até quando a pancada for tão forte e eu não levantar mais.
Eu vou continuar tentando, me esforçando, sendo teimoso.
Vou continuar correndo contra a ventania.
Farei o possível para chegar lá
E se eu não conseguir, poderei dizer que pelo menos eu tentei.

Enfim, encerrei dizendo aos jovens que a minha mensagem para eles é:
Tentem. Não importa quão difícil seja, quão longo seja a caminhada.
Continuem tentando, continuem insistindo, porque todo mundo merece um futuro.
E assim como eu estou lutando, eles precisam entrar pra luta e parar só quando chegarem lá.

Abri espaço para perguntas.
Ninguém fez.
Não sei se foi por vergonha ou por medo de ter que falar mais alto do que o normal pq eu estava muito nervoso e estava mais surdo que o normal, ou pq não tinham duvidas mesmo.
De qualquer maneira...

Foi uma experiência inacreditável que eu não quero esquecer nunca e eu realmente espero, que de alguma coisa eu tenha ensinado eles.

Mais tarde falei com a minha colega do financeiro, ela estava lá vendo a minha palestra, ela falaria logo depois de mim.
Perguntei a ela o que ela achou.
Acreditam que ela ficou emocionada?
Disse que os jovens também gostaram.
E isso me alivia muito, pq eu realmente fiquei muito preocupado se eles tinham gostado, pq eu quis fazer isso direito, por mim, por eles e por todos os envolvidos.

Tem dias que eu simplesmente não quero levantar da cama, não quero começar o dia ou tem dias como hoje, que o que mais quero é ir embora pra casa e ficar na cama, deitado no meu canto, mas pessoas de classe baixa não tem esse privilégio, então, fiquei aqui firme e forte fazendo o meu trabalho da melhor maneira possível.

A vida é para quem se atreve pessoal.
Precisamos continuar lutando.
Mesmo quando estamos jogados no chão, nos rastejando, precisamos continuar.
Porque eles não podem vencer.
Eles não vão vencer.
Porque eles não são ninguém para dizer como devemos viver nossas vidas.

Porque Deus ama a todos os seus filhos independente do que somos ou deixamos de ser.
Lembram o que eu falei no final do meu livro?

"Deus pediu que amassemos uns aos outros..."

PD.

6 comentários:

  1. Você tem garra e vai mais longe do que pensa. Apenas se permita mais.

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    1. Mais longe? Será mesmo? Não sei quem é você, mas muito obrigado.

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  2. Que post sensacional. Vá viver e nunca desista dos seus sonhos. Lembre do que falou para os jovens e nunca perca a esperança. Jovem seja feliz porque vc merece e se considere vitorioso porque teve coragem de fazer tudo o que fez até aqui..

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  3. Sensacional, quero uma foto sua todo arrumação!!

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